A grande verdade é que, sim, sempre temos escolha. O
que acontece é que nem sempre estamos dispostos a lidar com as
consequências e por isso criamos mecanismos de defesa para nos
protegermos.
Logo que comecei a trabalhar em agência de propaganda, eu via um
certo glamour em estar sempre ocupada, abraçar mais de dez projetos ao
mesmo tempo, passar horas em reuniões intermináveis e trabalhar até de
madrugada. O que o tempo me mostrou é que, na verdade, eu tinha a
necessidade de me sentir importante e competente e todas essas
atividades me faziam sentir dessa forma. Quando você identifica sua
necessidade primária, fica mais fácil entender o que você precisa mudar
em vez de simplesmente aceitar que é assim que deve ser.
Quando percebi que para me sentir importante e competente eu só
precisava fazer meu trabalho muito bem feito, eu passei a controlar o
tempo das reuniões, a dizer não para projetos que não faziam sentido ou
que eu não conseguiria fazer com a mesma qualidade por estar cuidando de
outras coisas e, raramente, ficava até depois das oito e meia
trabalhando.
Mas não é fácil reconhecer ou admitir qual é o problema e qual é a
verdadeira necessidade por trás de alguns dos nossos comportamentos. Por
isso, é inevitável começarmos a encontrar desculpas para justificarmos o
motivo pelo qual nossa vida é do jeito que é.
Um filme que eu amo e relata isso muito bem é “O Diabo Veste Prada”. A
frase preferida da personagem principal, a Andy, é: “Eu não tive
escolha”. Ela diz sempre que tenta explicar para todo mundo o porquê de
aceitar os absurdos vindos da chefe.
A grande verdade é que, sim, sempre temos escolha. O que acontece é
que nem sempre estamos dispostos a lidar com as consequências e por isso
criamos mecanismos de defesa para nos protegermos. Aqui vão algumas das
mentiras que eu costumava contar a mim mesma até que decidi mudar:
1. Se eu tivesse mais tempo eu faria “isso”
Como “isso” entenda qualquer coisa que você não faça por falta de
tempo. Pode ser um curso de línguas, exercícios físicos, sair mais com
os amigos, ler um livro, fazer caridade, não importa. Falta de tempo (e o
trânsito) virou a desculpa universal para justificar o fato de que não
somos disciplinados quando o assunto é gerenciar as 24 horas do nosso
dia. Uma coisa que eu aprendi é que quando você realmente quer fazer uma
coisa, você arruma tempo, por mais ocupado que você seja.
A questão aqui é que, ou você quer muito uma coisa, ou você não quer
tanto assim e o tempo não pode ser a desculpa por você não fazer.
Eu sempre quis ter um corpo sarado (#quemnunca). Toda vez que
aparecia uma nova musa-com-o-corpo-mais-perfeito eu ficava me sentindo
mal e pensando que eu devia me dedicar mais na academia. Mas sabe qual é
a verdade? Eu gosto da ideia de ter um corpo sarado, mas eu nunca quis
acordar às seis da manhã e ir à academia sete dias por semana, nem tomar
shakes de whey no café da manhã, nem comer batata doce no almoço ou
claras de ovos no jantar. E esse era o meu problema, mas eu sempre
tentei me convencer de que eu não era sarada porque eu não tinha tempo.
Aí você pode me dizer: “Mas Fê, eu juro que eu não tenho tempo para nada, minha vida é trabalhar.”
Eu acredito em você, mesmo! Só que ser ocupadíssimo também é uma
escolha. Nós investimos nosso tempo naquilo que é importante para nós,
por isso, se você está trabalhando oitenta horas por semana, é porque
tem alguma coisa que você queira mais do que tudo e que vai ser
resultado desse tempo investido no trabalho. E assim, você está deixando
de fazer outras coisas que no fundo não devem ser tão importantes
assim.
2. Se eu tivesse mais dinheiro eu poderia fazer “isso”
O dinheiro sempre foi a maior desculpa para tudo na minha vida. “Não
faço exercícios porque não tenho dinheiro para academia. Não falo inglês
porque não tenho dinheiro para pagar um professor particular. Não mudo
da casa dos meus pais porque não tenho dinheiro para pagar aluguel”. Um
monte de bobagem. É claro que muita gente realmente tem um orçamento
apertado. Acredite, eu já fui essa pessoa um dia. Quando pagava a minha
faculdade, eu almoçava marmita para poder vender o vale refeição e
muitas vezes só o que tinha na minha carteira por semanas era o vale
transporte.
E justamente por ter alguma experiência sobre o que era ter uma conta
eternamente negativa que eu te digo que dinheiro não é desculpa para
não fazermos as coisas.
Usamos a falta de dinheiro para nos convencermos de que nossa vida
não é incrível porque vivemos numa sociedade injusta e desigual onde os
ricos podem tudo e os pobres não podem nada. Mas eu vou te dizer uma
coisa: quer fazer exercícios? Todos os parques são gratuitos. Quer
estudar uma língua? Hoje é possível fazer isso de graça na internet
através de sites como o Duolingo. Quer viajar? Existem sites como
o Couchsurfing em que as pessoas deixam você dormir na casa delas sem
ter de pagar nada por isso.
É claro que estes são alguns pequenos exemplos, mas são coisas das
quais eu mais ouço as pessoas reclamando de que não podem fazer sem
dinheiro. Além disso, quando prestamos mais atenção em como gastamos
nosso dinheiro, fica mais fácil de fazer com que ele não desapareça.
3. Se “isso” acontecesse, minha vida seria perfeita
Aqui o “isso” pode ser comprar uma casa, arrumar um namorado, ter um
filho, ser promovido no emprego. O nosso grande problema é que o “isso”,
nesse caso, nunca será suficiente. É a lei da vida. O ser humano nunca
está totalmente satisfeito com o que ele tem e está sempre querendo algo
mais para ser feliz. Parece que é essa coisinha que falta que nos
impede de ter uma vida completa.
O problema é que, quando estamos sempre olhando para o que está por
vir, deixamos de aproveitar e agradecer pelo que temos hoje. Mas eu não
vou te dar o conselho óbvio da autoajuda que é viva o presente e
agradeça pelo que você tem hoje. Minha dica é: use essa necessidade que é
inerente ao ser humano de sempre querer o que não tem como motivação, e
não como a razão pela qual você não é feliz. Aprecie o desafio de
correr atrás desse objetivo e deixe que isso te faça feliz e não que a
falta “disso” te faça infeliz.
4. Eu mudaria “isso” na minha vida, se não fosse “aquilo”
Até pouco tempo atrás eu ainda morava com a minha mãe. Como ela
morava na Zona Leste e eu trabalhava na Zona Sul, você que conhece São
Paulo pode imaginar o inferno que era a minha vida no trânsito todos os
dias. Depois que o meu pai morreu, eu passei a ajudar financeiramente em
casa e conforme fui ficando mais velha, todas as vezes que alguém me
perguntava porque raios eu ainda morava na Zona Leste minha primeira
resposta era: “Eu adoraria mudar, mas eu ajudo a minha mãe e ela precisa
de mim”. Na minha cabeça isso não era uma desculpa, era a verdade.
Quando eu finalmente decidi mudar e ir morar com o meu namorado,
percebi que eu estava usando o fato de que eu ajudava a minha mãe
financeiramente para mascarar o real motivo pelo qual eu nunca me mudei.
No fundo, eu não sou uma pessoa que gosta de ficar sozinha. Eu gosto de
chegar em casa e ter com quem conversar. Ao mesmo tempo, depois de uma
certa idade não fazia tanto sentido para mim dividir apartamento com
amigas. Além disso, se eu tivesse de pagar aluguel ou um financiamento
imobiliário eu não teria feito nem metade das viagens que eu fiz e que
só consegui pelo fato de morar com a minha mãe. Não podemos deixar que
filhos, gato, cachorro, dívidas, emprego, mãe ou pai doente sejam
desculpas para aliviar o fato de que não temos coragem para tomar
algumas atitudes e lidar com as consequências que elas trarão para as
nossas vidas.
5. Eu não vivo sem “isso”
Na maioria dos casos, sim, você vive. Parece uma bobagem, mas quando
decidi que ia passar um tempo viajando algumas coisas ridículas
começaram a me preocupar. Por exemplo, eu tenho alergia a lâmina de
barbear, por isso sempre tive de fazer depilação. Como eu iria viver sem
fazer depilação? Pois é, estou viva e não estou nem peluda, nem
perebenta.
Se tem uma coisa que eu aprendi nesse pequeno período em que eu
estou viajando é que para tudo existe um jeito e que nós somos
completamente adaptáveis. Não existe nada com que você não vá se
acostumar a viver sem, desde coisas até pessoas. Certamente podemos
passar por um período de nostalgia ou saudade, mas depois de um tempo a
vida se ajeita e de alguma forma compensa aquela falta.
O que nos faz ter a sensação de que “isso” é tão importante para a
nossa vida ao ponto de não conseguirmos viver sem é que, muitas vezes,
colocamos em coisas ou pessoas a responsabilidade da nossa felicidade.
A grande verdade é que nossa vida é feita de uma enorme lista de boas
intenções que resultam algumas vezes em tentativas e muitas vezes
erros. A boa notícia é que se você acordar amanhã, existe uma nova
chance de tentar mais uma vez ;).
(F. Nêute)